segunda-feira, 2 de abril de 2012

REFLETINDO SOBRE A ORAÇÃO


"As melhores coisas que recebi de Deus são as que eu não pedi. Não é curioso como essa constatação revela a ineficácia dos nossos ritos?"

Acabei de divulgar as palavras acima através do twitter (@andersonexegese), e fiquei pensativo. Eu mesmo criei as frases, mas fiquei com a sensação de que havia muito mais para pensar e dizer sobre isso, e então volto a este blog, instrumento que uso desde 2007 para essas experiências.

Primeiro, experimentemos a primeira frase, testemos sua validade como aforismo: Me pergunto quais são as melhores coisas que recebi de Deus, e claro, penso em dádivas, presentes que eu realmente não tive qualquer participação na obtenção deles. Por exemplo, a própria vida é uma dádiva que (a não ser que você seja espírita) não pedi; porém, recebi a vida de Deus (a não ser que você não creia em Deus) e ela já dura trinta e três anos. Em unidade com a vida, recebi saúde física; o corpo que recebi talvez não seja tão forte como o dos mais privilegiados atletas, nem tão belo quando poderia, mas não posso me queixar. Foi um bom presente, que por muito tempo não valorizei. Agora penso na família que Deus me concedeu, na esposa cujos caminhos fez cruzar com os meus, e gratificante profissão que exerço com satisfação todos os dias... São muitas as coisas que eu não pedi, mas que me foram concedidas.

Agora eu vou inverter o raciocínio, pensar em coisas que eu pedi a Deus: Pra ser honesto, não estou me lembrando de nada grande que eu tenha pedido e recebido (fui até buscar outra xícara de café enquanto pensava nisso). Acho até que descobri algo sobre minha teologia pessoal. Eu não costumo pedir futilidades ou coisas que não são essenciais; minhas orações, que são poucas e mui breves, geralmente acontecem para pedir a manutenção daquelas grandes dádivas. Peço a Deus por minha saúde, por minha esposa, por nossas profissões, por nossas famílias... Às vezes oro por pessoas que precisam de algo que não podemos oferecer, ou peço que, dentro daquelas grandes dádivas, Deus nos preserve, nos permita crescer, realizar sonhos e desfrutar de novas felicidades. Contudo, sempre digo, após pedir, que o mais importante é ser feliz com ou sem essas "bênçãos".

Acho que, sem notar, criei um aforismo precioso: "As melhores coisas que recebi de Deus foram as que eu não pedi".

Depois de escrever estas palavras, talvez por hábito, lancei uma daquelas "alfinetadas" religiosas. Eu lido o tempo todo com públicos religiosos, e sinto que é preciso chocar para provocar a reflexão e o crescimento. Às vezes exagero, sou criticado, crio inimizades, mas nunca fui do tipo que envia mensagens lindas com a intenção de alegrar o próximo e melhor sua autoestima.

É estranho analisar o próprio texto, mas agora passo a falar sobre a segunda parte da minha mensagem, que é uma pergunta: “Não é curioso como essa constatação revela a ineficácia dos nossos ritos?". Aqui talvez o termo “ritos” não seja o ideal, pois falar de rituais religiosos evoca uma discussão demasiadamente ampla. Posso dizer que apenas a oração, que é uma prática religiosa muitas vezes ligada ao ritual, está em pauta. Também admito que “ineficácia” pode ser um exagero. Constatar que as grandes dádivas são aquelas que não pedimos não mostra que a oração é uma prática ineficaz. Aliás, teríamos que definir a que tipo de oração estamos nos referindo.

Como vêem, meus hábitos acadêmicos tornam qualquer conversa extensa e por vezes complicada. Simplificando, eu penso no ato de pedir coisas a Deus, prática muito comum nas religiões, e que hoje praticamente conduz toda a vida de muitas pessoas e instituições. O problema é que não notamos que já recebemos o que é importante, e que tais práticas religiosas deveriam ser motivadas mais pela gratidão do que pelo desejo de obter algo mais. Deveríamos agradecer muito e pedir pouco. Entretanto, tanto pedimos que fica evidente a ineficácia desse tipo de prática religiosa. A verdade simples é que as pessoas não são atendidas na grande maioria dos seus pedidos, mas nem notam quão ineficaz é sua oração, já que haviam pedido coisas de importância relativa.

Bem, não quero desestimular ninguém, nem espero que a religiosidade brasileira seja revolucionada por tais páginas. Mas vale o esforço reflexivo, pois tenho esperança de que alguém vai entender o que estamos discutindo e vai achar o peito cheio de gratidão. Arrisco-me até a dizer que aqueles que não cessam de orar, ou são pessoas que estão carentes de alguma necessidade básica, ou são pessoas que expressam sua ganância através da religião.

Se você tem uma boa família, tem saúde, tem suas necessidades elementares supridas, e não está em contato com ninguém necessitado, é natural que não se sinta compungido a orar a noite toda. Quem sabe que já tem tudo o que alguém pode ter de mais precioso, não faz questão de ficar pedindo mais e mais. Provavelmente você agradecerá a Deus algumas vezes ao longo do dia, e isso lhe parecerá suficiente. Mas há quem tem tudo isso e ainda insista em longas orações. Tudo bem se você quer orar pela igreja, pelos pobres, pelos enfermos, mas a verdade é que não há como ficar uma hora inteira de joelhos sem pedir alguma bobagem. E quem nunca pediu coisas que achava que precisava, e hoje agradece por não ter recebido?

Será que estou buscando justificativas para minha religiosidade descompromissada? Talvez tenha um pouco disso nas minhas palavras, mas provocar a reflexão sempre vale a pena.


2 comentários:

Célia Roque disse...

Olá Caro mestre!
Sua publicação caiu bem, ainda uns dias atrás, me peguei pensando sobre oração e o quanto tempo não parava para orar,penso como vc, recebo diariamente a graça, a vida,o perdão, o milagre da vida.Creio que não seja um descompromissado, mas um desmitologizado, como vc mesmo disse o meio acadêmico oferece esta liberdade!

Unknown disse...

Boa noite , é natural do homem sonhar e por consequencia em sua oração colocar o desejo do coração , mas jesus nos ensina em seu modelo de oração: seja feita a vontade de Deus que entendemos é boa, agradável, e perfeita , e cremos o Espírito ajuda as nossas fraquezas; porque não sabemos o que havemos de pedir como convém, mas o mesmo Espírito intercede por nós com gemidos inexprimíveis.
porque a maior dadiva realmente Anderson é a vida , pois estavamos mortos ,separados de Deus mas hoje temos vida uma vida que como agua salta para eternidade.