Não é preciso muita experiência teológica ou mesmo pedagógica para constatar que muitas das pessoas que decidem estudar a Bíblia sob uma ótica acadêmica ou científica, seja numa faculdade de teologia ou noutro lugar, acabam por atravessar período de crise. Alguns estudantes perdem a fé que tinham e nunca mais voltam a crer como antes; esses tornam-se céticos e passam a lutar contra a fé das outras pessoas com argumentos agressivos. Outros atravessam o período da crise acadêmica e depois conseguem administrar sua vida religiosa, mas adquirem sérias dificuldades para lidar com as instituições religiosas e nunca mais sentem-se parte da antiga igreja.
Há vários fatores a considerar; primeiro falemos dos tipos de instituição de ensino: Há faculdades de estudo bíblico que procuram acima de tudo formar religiosos preparados para determinados serviços; nelas as crises de fé são mais raras, pois partem de um pressuposto religioso, de uma fé comum que é partilhada por professores e alunos. Mas há as instituições imparciais, que não adotam qualquer regra de fé em seus métodos e currículo, e que não preocupam-se com a ocupação eclesiástica dos alunos; o objetivo dessas instituições é transmitir aos alunos um conhecimento sobre a religião de forma geral, que lhes dará a oportunidade de trabalharem fora das igrejas. Minha opinião é que o segundo tipo de instituição é melhor, pois quem ensina a partir da fé, ignora ou omite todas as informações que porventura possam chocar-se com suas convicções. Fugir das crises numa instituição conservadora ou denominacional é fugir também do conhecimento.
Um segundo fator interessante é que muitos dos alunos que um dia atravessam suas crises de fé eram antes do estudo os mais devotados religiosos. Isto é, geralmente aqueles que procuram aprofundar-se estudando religião fora dos limites de sua igreja são os mais interessados, os mais ativos, os que sonham em servir a seu Deus da melhor maneira possível. Assim, a conclusão que chegamos é que tais crises dificilmente são evitadas, pois até mesmo os mais convictos sentem-se abalados nos fundamentos de sua fé. Os resultados finais podem variar, mas os choques intermediários sempre acontecem.
A pergunta agora é esta: Por que estudar provoca crises de fé tão sérias? Que incompatibilidade há entre o conhecimento e a fé que provoca tais crises? Antes de responder à pergunta eu diria que a crise não se limita aos estudos religiosos, mas que toda faculdade provoca algum tipo de desestrutura. Isso não é ruim, é sinal de que estamos aprendendo coisas novas e tendo de corrigir coisas velhas e equivocadas. Porém, nossa mente não se deixa purificar das antigas convicções tão facilmente, e tal processo de troca de convicções é o que chamamos de crise. É como aquilo que todos nós experimentamos na adolescência, mas agora sem relação nenhuma com nossa idade.
Agora, para responder a questão a meu modo, devo admitir que há sérias incompatibilidades entre a nossa fé e a razão. Na verdade, não há problemas entre fé e razão, pois a fé sempre existiu respondendo provisoriamente as perguntas que a razão não podia, mas há sim incompatibilidade entre a religião que praticamos e a razão. O problema não é Deus, mas as igrejas. Ao estudar, notamos que estávamos enganados em relação às nossas igrejas, que elas não são as “donas da verdade”, que suas “leis” não possuem bases bíblicas tão firmes quanto imaginávamos, e que sempre há um incontável número de coisas que lá estão simplesmente por tradição ou interesses pessoais. Eis aí nossa crise: colocamos nossa fé não somente numa divindade, num criador ou na vida eterna (coisas que conhecimento nenhum pode confirmar ou contradizer), mas na santidade das pessoas, na honestidade das instituições, na transparência dos religiosos, na boa vontade dos homens, na veracidade dos discursos... Não é por acaso que algumas instituições proíbem o estudo, querem regular o progresso acadêmico dos membros ou abrem centros de ensino próprio para ensinarem apenas aquilo que aprovam.
Essa reflexão ainda iria longe, mas vamos encerrar nossa conversa dizendo que, com base no que já foi dito, o conhecimento é um tesouro valioso que devemos buscar. As crises não devem ser evitadas, mas bem recebidas como processos de amadurecimento pelos quais devemos passar. Uma dica: se você está em crise por ver em determinado ensino algo contraditório com sua fé, procure resolver a crise pensando no assunto e levando aos mestres todos os seus argumentos. Quando não há argumentos para negar aquela suposta heresia, é hora de reconhecer que ela provavelmente é a verdade, e que você precisa substituir certo conhecimento por um novo.
Mas e a igreja? E como vou pregar depois dessas aulas? Será que ainda vou crer depois desse curso? Será que ainda vou agradar a Deus com tantas questões? Minha resposta é a seguinte: esqueça seus antigos planos, coloque seu ministério até sua fé em segundo lugar e dê lugar para a verdade. Se há um Deus, ele está bem atrás da verdade, e não atrás das coisas duvidosas. Lembrem-se que toda religião julga-se a verdadeira, e dificilmente só essa sua está com a razão. Aceite que em alguns aspectos você pode estar enganado também. Temos que buscar a verdade, ainda que ela não venha da igreja ou da Bíblia, mas da academia, dos livros ou de onde quer que ela venha.
Estas linhas foram escritas para todos os estudantes de teologia com os quais tenho tido contato, sejam eles da graduação, do mestrado ou do doutorado. Quem escreve é um homem em constante crise, mas agradecido pela liberdade que cada uma delas me dá.
26 comentários:
O que vc escreveu Anderson é uma verdade, entramos em crise quando dexamos o velho pra trás e damos lugar para o novo. Eu tenho crise até hoje fazendo sociologia.
Abração
verdade que não venha da bíblia???
Tá louco????
Vc já deveria ter voltado atrás em suas decisões erradas e agora quer buscar verdades fora da bíblia!!!!
Volta prá terra.
O comentário "anônimo" é de quem precisa crescer e aprender a ler. Seu texto é de ótima qualidade, que, aliás, assim como muitos textos bíblicos contém muitas verdades!
Pois é, o "Anonimo" deve estar estudando em alguma instituição denominacional...Não entendeu nada do que leu no texto!
Boa, estou gostando da discussão.
Fiquei feliz de ver que estão lendo o texto. Pretendo ajudar dezenas de pessoas que tenho encontrado em crise. Que haveria discordância todos já sabíamos.
Só quem já saiu algum dia do culto e da escola bíblica entende o que estou dizendo, não é Fábio. E agradeço ao amigo Oliveira também pelo apoio, e parabéns pela maturidade. Entendeu que não nego as verdades bíblicas, mas estranho é achar que só ela tem verdades. ela mesma nos diz que Deus se revela de outras maneiras. Meu pai, Edson, foi muito sensato no comentário, temos que compreender que o amigo anônimo não está entre os estudantes que precisaram superar crises de conhecimento. Eu o aconselharia a enfrentar algumas.
Amigo anônimo, não peço que concorde, mas coloco-me a disposiçao para debatermos o tema se quiser. No final do blog está meu e-mail, mas acho que já sabe disso, já que leu todo o texto e disse que acompanha minha carreira há algum tempo.
Veja só minha opinião: quem está andando em núvens é quem acha que o Salmo 137.9 é um texto divino. Na terra chamamos isso de assassinato, de violência contra incapazes. Não é porque um dia me disseram que a Bíblia é a Palavra de Deus que tenho que procurar desculpar o texto com mentiras.
Provavelmente eu sou, dentre a maioria dos leitores, o que mais ama a Bíblia. Eu vivo dela, estudo-a o tempo todo, ensino-a constantemente, dependo dela. Ela me ensina muito sobre a fé dos homens. Não pense que eu virei inimigo da Bíblia, eu só me livrei dos preconceitos e falo o que nela está escrito sem os "óculos" dourados que a igreja distribui. Minha não fé não depende do pastor, da igreja, e nem da Bíblia. Deus é muito mais que tudo isso.
Mas adorei a discussão. Ver alguém discordando e outros demonstrando afinidade com meus pensamentos. Espero continuar.
Abraço a todos.
Olá meu professor!
Perdoe-me, mas esses seus argumentos estão parecendo aqueles bem antigos do segundo século de nossa era: Gnosticismo e mesclado com uma forte dose de alta crítica. Coisa velha que não produziu muitos benefícios ao crescimento do Reino de Deus e do conhecimento de Cristo Jesus em nossa época.
Oi Carlos!
Então, não entendi muito bem o paralelo entre o que eu disse e o pensamento do século II. Minha preocupação aqui é o efeito que o ensino acadêmico provoca em todos nós.
Mas aí vai um alerta: Cuidado com o pré-conceito em relação ao gnosticismo. Nós lemos as cartas de João e já achamos que o gnosticimos é um erro sem ler nada de originalmente gnóstico. A igreja católica adotou um tipo de cristianismo dentre as dezenas que existia, e esse tipo está em nossa Bíblia. Será que foi a melhor escolha? Será que não existiam outras maneiras de ser cristão que também mereciam seu lugar no cânon?
E a alta crítica, é algo como a crítica literária que discutimos há algumas semanas? Se for, eu a apóio, mas também não entendo a relação disso com meu texto.
Mas obrigado por ler. Aproveite as crises.
Parabéns pelo texto! Merece ser lido por todos os que estudam e se apaixonam por este fenômeno chamado fé.
Eu acho interessante, a posição do anonimo, se diz detentor dos dogmas intocaveis, provavelmente seja seguidor de alguma máquina religiosa que arrecada uma grana preta a custa dos fieis pobres, se diz guardião de uma postura moral intocavel, mas não mostra a cara. Amigo vc é um covarde que pra falar alguma coisa tem que esconder a cara, eu darei credito a vc quando postar alguma coisa com o seu nome verdadeiro.
Parabéns pelo texto Anderson,
Não sou estudante de teologia,em nenhuma instituição. Pois ainda não obtive condições financeiras, por essa razão agradeço muito a disponibilidade de seus textos os quais estou acompanhando e aprendendo a cada postagem. Conheci se seu trabalho atraves do meu amigo Keiker que é seu aluno no ICEC. Desde que "aceitei o cristianisno" se posso dizer assim, sempre me achei um ET. Mais lendo seus textos fico feliz porque sei que mesmo ainda muito distante estou no caminho certo.
Agradeço a vocês amigos pela leitura. Ao meu parceiro Fábio pelo apoio quase violento, ao Felipe e ao Leonardo pelo tempo dispensado ao meu trabalho.
Leonardo, há vários nomes que costumam ser usados para pessoas como nós. ET pode ser uma opção, mas há quem nos chame de heregew ou insubmissos. Porém, a verdade é que só estamos tentando viver nossa fé de um modo diferente do convencional.
Colaborem divulgando esse texto àqueles que precisam dele por mais alguns dias, e acompanhem o blog pois até o final da semana disponibilizarei um novo texto para ensinar os humildes, incitar as discussões entre os sábios, e a ira entre os "quadrados".
Uau! Texto perfeito!
Assim como o Leonardo, de um tempo para cá, tenho me sentindo um ET dentro da igreja rs.
Nasci no berço evangelico, meus pais sao Pastores Presidentes e de verdade eu nunca fui muito afim de ler e estudar sobre a Biblia. Então eu vivia dos sermões que eram ministrados, até que um dia não deu mais. Tinha algo errado, algo curioso, perguntas sem respostas e então os sermões nao me serviam mais.
Comecei minha busca pelos Judeus, estudo sobre eles, raça, costumes, simbolos.. Até em sinagoga eu vou rs.
Então, automaticamente... começou a "crise de fé". É estranho você ler um texto e saber que de fato nao aconteceu e que nao passa de figura de linguagem. Que mar nao se abriu coisa nenhuma, que talvez Adao e Eva nao existiram rsrs.. e ai começa toda a crise...
Voce começa a estudar e nao aguenta os irmaos pregando que Jesus nasceu em Belem... Que Jó existiu rsrs...
Enfim.. é uma crise dificil de passar, porque toda aquela religiosidade que voce seguia voce descobre que nao existe. Que tudo é pecado entao voce pode isso.. pode aquilo.. é como se abrisse as portas da prisao e voce agora fosse livre, livre para fazer o que quiser!
Alguns se perder... eu esfriei muito na igreja, porque o que me preenchia antes, agora nao passava de pessimos sermoes feitos corridos numa tarde de domingo.
Mas nao deixo de estudar, a crise da minha fé passou, porque nao tem como permancer nessa crise estudando a cerca de Deus. Hoje eu tenho a plena convicção de que eu estando ou nao dentro de uma igreja, minha fé não muda.
A biblia é sim nosso livro de cabiceira, mas existem muitos outros livros, com escritores fantasticos e que parece que o proprio Deus revelou para esses algo muito mais atual e totalmente favoravel para nós. Nao que a biblia nao seja, mas existem outros meios de informações e quando voce junta a Biblia e esses livros fantasticos voce vira um "Anderson" rsrs.
Parabens pelo texto!
Quanto ao nosso amigo Anômino ai vai:
Por isso digo que a biblia, mesmo revelando aspectos do caráter de Deus, revela muito mais sobre o caráter de quem a lê...
Veja por exemplo Lutter King e Edir Macedo... Os dois inspirados no mesmo livro... Só que um via em Jesus um pacificador que pregava a igualdade entre as pessoas. o Outro via em Jesus um líder empresarial. Daí vc tira...
Ola Anderson realmente, estudar tem provocado essas crises de fé, mas tem sido bom começo a perceber que podemos ver as coisas por outro anglo sem perder a fé em Deues.
Obrigado por ler e comentar!
João, novo amigo, agradeço seu apoio. E estamos só no começo. Temos muitas crises para atravessar, o que deve nos trazer grande maturidade.
E à Thalyta, puxa, ficamos muito contentes com suas palavras. Digo nós, eu e minha esposa. Lemos sua experiência admirados. Quando ao misterioso anônimo, ele é nosso conhecido. Há milhares como ele coitado, nenhuma originalidade, nenhum pensamento próprio, nada de interessante pra dizer. Pobres papagaios de pastor!
Vamos agora vasculhar aquele blog: seescarafunchar.blogspot.com
Abraço.
paz andersommm!aqui é o joão batista galdino do seminario batista independente!tenho lido seus textos e suas colocações,e parabens.eu penso que quem tem a fé firmada em Cristo nao vai se desviar por causa de assuntos que não entendeu!Suas colocações sao dignas de reflexóes.parabens pelo blog!!tamos ai e que DEUS continue te abençoando a vc e toda sua familia!!abraços
PARABENS !!!
Puxa digo eu rs..Muito bom receber um elogio de pessoas que entendem do assunto como vocês.
Tenho certeza que aprenderei muito em seu blog.
Obrigada.
Abs
Thalyta Ingryt
Interessantíssimo Anderson. Seria excepcional se todos tivessem esse ponto de vista e, ao invés de sofrer com a crise, estivessem realmente dispostos a aprender.
Abraço,
Eliane.
Ola professor, confesso se vc tivesse escrito esse texto a dois anos atras teria me ajudado muito, rsrsrsr, enfim, e muito chato saber que a instituição em que sempre prezei a igreja Deus tem batido a porta querendo entrar, e que o Reino de Deus passa longe, hoje sei por que as pessoas davam risada da minha fé, por que fé sem razão e fanatismo, e a igreja e certos seminarios querem gerar fieis, e esses por sua vez não questionam, e fazem tudo sem ao menos pensar e titubear, por que pensam estar fazendo a vontade de Deus, ja dizia Jesus a verdade liberta, mas alguns não aguetan ouvir a verdade e fazem questaum de colocar navamento as augemas, parabens, vc escrevo com maestria, espero um dia chegar la.
Pois é, como o João disse, ninguém perderia a fé se quando se defrontasse com o conhecimento acadêmico tivesse a fé estabelecida no lugar certo. Sempre digo que nós é que críamos em coisas falsas, e devíamos agradecer quando nos ensinaram que tais coisas não eram verdade. A experiência individual que alguém tem com Deus não pode ser abalada pela Universidade, mas os princípios ensinados dos púlpitos e escolas bíblicas costumam desabar. O problema não está no ensino, mas no lugar onde depositamos nossa fé. Deixemos Galdino de crer na literalidade das fábulas...
Sou grato à Eliane pela atenção dedicada ao meu texto, e pelo interesse em aprender exegese comigo. Ela tem se mostrado um exemplo positivo de como proceder diante do conhecimento acadêmico.
E em relação ao último comentário, do meu amigo Keiker, eu só posso lamentar por ter chegado tarde à sua necessidade. No entanto, sua participação mostra aos leitores mais uma vez que quem já passou por isso entende a validade do que tenho dito. Se um dia sofremos sozinho em nossas crises, ajudemos agora os outros que ainda estão passando por ela.
Mais uma vez, obrigado pelo apoio de todos. Conto com vocês para a divulgação deste material.
Estou iniciando no ICEC e vejo o texto com bons olhos. Util e providencial. Observo e classifico dois objetivos: 1) Ousadia e Transparêcia do perfil do escritor (Prof.Anderson) 2) Esclarecimento e apoio aos iniciantes que provavelmente ainda não entraram "nesta" crise e para os que estão ou já sairam dela. Por tudo isso só tenho a agradecer, pois as reponsabilidades de ponderação e discernimento são minhas e não do mestre. Valeu Anderson, continue transmitindo a sua verdade.
Antenor, é um prazer comunicar-lhe minhas reflexões também por aqui.
Acho que captou meu perfil. Tento ser transparente acima de tudo, falar o que me parece ser a verdade, até que alguém me convença do contrário. Quanto à ousadia, sei que vários dos meus trabalhos parecem ousados aos leitores, mas é porque a grande maioria só repete o de sempre. Além disso, sei também que os textos mais polêmicos são os mais lidos e comentados, por isso gosto deles.
Também digo sempre que não sou pastor, mas professor, e por isso minha preocupação é didática e não a edificação "espiritual" das pessoas... É algo natural. Este texto em especial me parece bem útil aos estudantes de teologia, espero que continue ajudando meus amigos pelos anos que virão.
Obrigado pelo comentário e leitura.
PRECISO mencionar sobre um livro do autor Marcos Tadeu Cardoso intitulado de A VERDADEIRA FACE DOS LIDERES RELIGIOSOS, demias esse livro... Ele fala e desmascara o Bispo Edir Macedo e profeta William M. Branham. O autor desmascara e fala da corrupção e da manipulação dos fiéis, ele está disponibilizado gratuitamente no 4shared.
O web site dele é
http://marcostadeucardoso.blogspot.com
Paty disse...
Muito bom, parabéns!
Gostei do texto.
Coisa boa repercute por anos...
Agora, não creio que esse lugar é para os reclamantes de plantão. Mas, para quem está disposto a pensar.
Abraços
César
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